
Consumo de alimentos ultraprocessados e seus efeitos sobre o perfil antropométrico e glicêmico
O excesso de peso e consequente resistência à insulina são fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis (DNTs). Vários padrões alimentares estão associados ao excesso de peso, como ingestão de alimentos ricos em gordura e energia, e dietas com alta carga glicêmica.
Nesse contexto, na última década, especial atenção tem sido dada à relação entre as distinções de alimentos por tipo de processamento industrial. Análises de pesquisas dietéticas nacionalmente representativas conduzidas em países de alta e média alta renda têm consistentemente relatado que o consumo de alimentos ultraprocessados impacta negativamente na qualidade nutricional das dietas. Alimentos ultraprocessados frequentemente apresentam quantidades relativamente altas de tipos não saudáveis de gordura, açúcar livre e sódio; maior resposta glicêmica; e menor potencial de saciedade em comparação com alimentos não processados ou minimamente processados. No entanto, as vendas de produtos ultraprocessados estão crescendo rapidamente em todo o mundo, especificamente no Brasil, onde o crescimento anual de alimentos ultraprocessados é de 2,1% ao ano, quase o dobro do crescimento anual do Canadá (1,3% ao ano).
O impacto do consumo de alimentos ultraprocessados na epidemia global de DNTs é uma questão relevante. Estudos têm demonstrado uma associação positiva entre o consumo de alimentos ultraprocessados e o risco de sobrepeso e obesidade e doenças relacionadas, como hipertensão arterial sistêmica e câncer, e também processos relacionados à inflamação na composição da microbiota humana. No entanto, apenas um número limitado de pesquisas investigou a associação entre o consumo de alimentos ultraprocessados e os danos à saúde durante a infância.
OBJETIVOS DO ESTUDO
Investigar a associação entre o consumo de alimentos ultraprocessados na idade pré-escolar e as medidas antropométricas da idade pré-escolar à escolar e o perfil glicêmico em idade escolar.
MÉTODOS E RESULTADOS
Tratou-se de um estudo controlado randomizado, realizado com 307 crianças de baixo nível socioeconômico de São Leopoldo, Brasil. Aos 4 e 8 anos de idade, as avaliações antropométricas foram coletadas da idade pré-escolar até a idade escolar, incluindo índice de massa corporal (IMC) para idade, circunferência da cintura (CC), relação cintura/estatura (RCE) e dobras cutâneas. Na idade de 8 anos, foi avaliado a glicemia. Os dados dietéticos foram coletados por meio de recordatório de 24 horas e questionário de frequência de alimentos ultraprocessados. A análise de regressão linear foi utilizada para avaliar a relação entre o consumo de alimentos ultraprocessados e os desfechos. A porcentagem de energia diária fornecida por alimentos ultraprocessados foi de 41,8 ± 8,7 (753,8 ± 191,0 kcal) na idade pré-escolar e 47,8 ± 8,9 (753,8 ± 191,0 kcal) em idade escolar, em média. As análises de regressão linear ajustada mostraram que o consumo de alimentos ultraprocessados na idade pré-escolar foi um preditor de aumento no delta CC da idade pré-escolar (β= 0,07; IC95% 0,01 – 0,14; P= 0,030), mas não para o metabolismo da glicose.
CONCLUSÃO
Os dados sugerem que o consumo precoce de alimentos ultraprocessados desempenhou um papel no aumento da obesidade abdominal em crianças. Esses resultados reforçam a importância de estratégias eficazes para prevenir o consumo excessivo de alimentos ultraprocessados, já em idades precoces.